Como teístas, isto é, como religiões monoteístas que assentam na crença de um só Deus que tudo sabe (omnisciente), que tudo pode (omnipotente), sumamente bom, atemporal e único criador do universo, temos de recuar menos ainda. Isto se pensarmos no cristianismo, com pouco mais de 2000 anos, e no islamismo, pois claro, com cerca de 1500 anos apenas. Uma vez que o judaísmo, a primeira grande religião monoteísta, é anterior aos cultos do Egito antigo, de onde os judeus acabariam por ser expulsos.
Embora sejam todas abraâmicas, isto é, com origem em Abraão, e estruradas sobre escrituras sagradas, daí também serem apelidadas de religiões do Livro, as três religiões monoteístas exibem algumas diferenças entre si. Por exemplo, ao contrário do Cristianismo, o deus dos judeus é total e radicalmente transcendente, isto é, jamais poderia ter assumido a forma humana. É essa, aliás, a grande diferença entre estas duas religiões, que partilham um mesmo livro: o livro sagrado para os judeus, a Tora, corresponde ao Pentateu, os cinco primeiros livros da Bíblia, que constituem o Antigo Testamento onde surge a figura de Abraão (Genesis) e não Cristo, filho de deus para os cristãos, que surge apenas no Novo Testamento. O Alcorão, por sua vez, é o livro sagrado dos muçulmanos. Um livro supostamente escrito com a intervenção direta de Alah, o nome de deus para o Islão, uma vez que há fortes razões para acreditar que o seu profeta e difusor, Maomé, teria sido analfabeto.
Nas próximas publicações terás oportunidade de analisar algumas provas da existência deste deus teísta: omnipresente, omnisciente, sumamente bom, criador de tudo e de todas as coisas... Para já, deixo-te um texto que poderá ajudar-te a compreender a origem dos três monoteísmos, mas agora do ponto de vista de um ateu ou ateísta, isto é, alguém que nega convictamente, às vezes agressivamente, a existência de qualquer deus:
"Visto
que só os homens inventam mundos escondidos, deuses ou um só Deus; só eles se prosternam,
se humilham, se rebaixam; só eles fabulam e se convencem das histórias
fabricadas pelas suas preocupações de modo a evitar olhar de frente o seu
destino; a partir das suas ficções, só eles constroem um delírio que arrasta
consigo uma ladainha de disparates perigosos e novas escapatórias; de acordo
com o princípio de Gribouille, só eles trabalham arduamente na realização
daquilo a que, ainda assim, fogem como de nenhuma outra coisa: a morte.
Parece-lhes
impossível viver uma vida que tem a morte como fim inevitável? Depressa tratam
de convocar o inimigo para lhes governar a vida dispondo-se a morrer um pouco
todos os dias, regularmente, com o intuito de acreditar, logo que a hora chegar,
numa passagem mais fácil. As três religiões monoteístas convidam a renunciar ao
vivo aqui e agora sob o pretexto que um dia será necessário fazê-lo: glorificam
um além (fictício) para impedir que se frua plenamente o aqui-em-baixo (real).
O carburante que usam? A pulsão de morte e as incessantes variações sobre esse
tema.
(...)Animados por uma mesma pulsão de morte genealógica, os três monoteísmos partilham uma série de desprezos idênticos: ódio à razão e à inteligência; ódio à liberdade; ódio a todos os livros em nome de um só; ódio à vida; ódio à sexualidade, às mulheres e ao prazer; ódio ao feminino; ódio ao corpo, aos desejos, às pulsões. Em vez de tudo isso, judaísmo, cristianismo e islão defendem: a fé e a crença, a obediência e a submissão, o gosto pela morte e a paixão pelo além, o anjo assexuado e a castidade, a virgindade e a fidelidade monogâmica, a esposa e a mãe, a alma e o espírito. O mesmo é dizer a vida crucificada e a celebração do nada…
(...)
Os defensores da lei mosaica, os farelórios crísticos e os seus clones corânicos partilham a mesma fábula sobre a origem da negatividade no mundo: seja no Génesis (III, 6) – comum à Tora e ao Antigo Testamento da Bíblia cristã -, seja no Alcorão (II, 29), lá está a mesma história de Adão e Eva num Paraíso, proibidos de se aproximarem de uma árvore por um Deus enquanto um demónio os convida à desobediência. Uma versão monoteísta do mito grego de Pandora, a primeira mulher a cometer evidentemente o irreparável e assim a espalhar o mal pelo planeta."
( Michel Onfray, Tratado de Ateologia )
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