Segundo Levinson, exatamente para que o estatuto de obra de arte não dependa do acaso nem da vontade circunstancial dos Midas quase exclusivamente movidos pelo Mercado, devemos concentrar-nos em dois aspetos: no próprio processo de criação artística e na relação que esse processo estabelece com criações artísticas precedentes, de modo a poder ser considerado um momento único de uma mesma longa história, a História da Arte. Dito de outro modo, para utilizarmos um termo filosófico de que ainda te recordarás, devemos concentrar-nos no carácter ontológico da obra de arte, na sua natureza íntima, independentemente de ser, ou não, reconhecida publicamente enquanto tal.
Em termos de condições necessárias e suficientes, isto é, daquilo que não pode deixar de ser observado para que possamos afirmar estar perante uma obra de arte, Levinson propõe que consideremos duas:
1. O direito de propriedade. Segundo esta condição, os artistas não deverão sentir-se autorizados a transformar em obra de arte um objeto que não lhes pertence, a não ser que tenham obtido a devida autorização dos respetivos proprietários. Ficando resolvido deste modo um dos maiores problemas resultantes da Teoria Institucional, segundo a qual qualquer objeto poderia ser convertido em obra de arte por mero batismo.
2. A intenção do artista. Segundo esta condição, a obra de arte não poderá nunca ser fruto do acaso nem de qualquer capricho. Tem que expressar uma intenção, nomeadamente a de estabelecer uma relação com a arte do passado. Isto quer dizer que a obra de arte, por muito original e disruptiva, será sempre considerada tendo em conta a tradição em que se inscreve ou de que se afasta.
Em termos gerais, Levinson formula a definição histórica de arte do seguinte modo:
X é uma obra de arte se, e somente se, X é um objeto que uma pessoa, proprietária desse objeto ou devidamente autorizada para o usar, pretende perspetivar de forma não passageira como obra de arte. Isto é, do mesmo modo que obras de arte anteriores foram perspetivadas.
Embora relativamente consensual, sobretudo porque denuncia o ridículo em que algumas manifestações artísticas contemporâneas acabam por cair, a teoria histórica de Levinson também foi alvo de objeções. Deixo-te algumas de seguida.
1. O direito de propriedade não é uma condição necessária para haver arte. Se assim fosse, teríamos que deixar de considerar obras tão importantes como as de Leonardo Da Vinci ou Boticelli, na pintura, uma vez que foram produzidas com materiais roubados.
2. A condição da intencionalidade também não é uma condição necessária para haver arte. Kafka, por exemplo, um escritor Checo autor de obras literárias admiráveis - O Processo, O Castelo, A Metamorfose... -, deixou claro que alguns dos seus manuscritos deveriam ser destruídos após a sua morte. Contrariando, portanto, a ideia de Levinson segundo a qual o artista terá sempre a intenção de perdurar na história. A verdade é que as obras foram publicadas, contra a vontade expressa do seu autor, e continuam a ser lidas por todo o mundo.
3. Ficamos sem saber que dizer em relação às obras de arte primordiais e de arte primitiva que se lhes seguiram: se para ser arte é necessário que o objeto em questão se relacione com a sua história, as obras primordiais não poderão ser consideradas arte porque antes delas não há arte. Por outro lado, se não considerarmos arte as obras primordiais, as obras de arte primitiva, as que se seguem às primordiais, também não têm referência em relação à qual se posicionam. Logo, ficamos igualmente sem saber como poderão ser consideradas manifestações artísticas.
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